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segunda-feira, 21 de abril de 2008

A ÁGUA - Enfoque antropológico

Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã água, a qual é muito útil e humilde e preciosa e casta! (São Francisco de Assis)

Quimicamente, a água é um elemento relativamente simples. Uma hidromolécula, a menor unidade do elemento chamado água, compõe-se de duas partículas de hidrogênio e uma de oxigênio. São essas moléculas que, juntas, formam as gotículas, que, por sua vez, formam as pequenas e grandes massas de água: a caneca de água que mata a nossa sede, a água que nos lava o corpo, as chuvas que se precipitam sobre a terra, os rios que serpenteiam pelos vales, os mares que enchem os abismos.
Na exata medida em que se alargam os nossos conhecimentos, firma-se também a consciência de que a água não é apenas um sustento, mas um dos sustentáculos da vida, na forma como nós a conhecemos.
As águas, ensinam-nos hoje as ciências, foram o berço da vida, nas suas manifestações mais primitivas. Estudos bastante intrincados comprovam-nos ainda que a água, em estado líquido, é um elemento não muito comum no universo. Em temperaturas muito baixas, os elementos, sabidamente, se solidificam. Acima de um certo ponto de densidade atmosférica e calor, eles evaporam. Em todo o nosso sistema solar, somente a terra parece oferecer as condições naturais necessárias para que a água exista como líquido.
Complexa é a coisa, pois se, por um lado, a água só se forma numa faixa térmica relativamente estreita, doutra parte, uma vez existente, é exatamente a água que passa a funcionar como uma espécie de regulador térmico do lugar onde ela se encontra. O calor absorvido e armazenado por ela durante o dia é expelido durante a noite, impedindo variações climáticas extremas. E até onde, hoje, alcançam o nosso olhar e os instrumentos de nossa astro-tecnologia, o universo tem se revelado como bastante seco, isto é, constituído, predominantemente, de material gasoso ou sólido.
A água é mesmo um fenômeno raro e algo coincidente com a própria vida, isto é, onde ela ocorre, aí também se dá a vida em profusão.E embora sejam possíveis outras formas de vida sem esse elemento, a vida, na sua diversidade e complexidade, assim como ela se constituiu no planeta terra, está intimamente ligada à existência dessa matéria em estado líquido.
Os seres vivos não precisam apenas de água. Eles são, num percentual bastante elevado, compostos de água. Setenta por cento do corpo humano, por exemplo, é constituído de água, seja fluindo na corrente sangüínea e nos outros líquidos do organismo, seja no interior de cada uma e de todas as células de nosso corpo.
Três quartos da superfície da terra estão cobertos por água. Isto não é demais. Uma quantidade menor ou uma alteração brusca na quantidade e na dinâmica cíclica das águas e muitas formas de vida desapareceriam.
Mesmo antes desses estudos acurados, a importância da água para a vida nunca escapou à percepção humana. Aliás, para saber que a água é essencial e preciosa não é necessário fazer nenhum curso de bioquímica. Basta ter sede.Entretanto, a água não é apenas aquela substância translúcida, que cai dos céus nos dias tórridos de verão, refrescando-nos, e que corre, mansa e benfazeja, pelos sulcos da terra, encantando os olhos e fecundando a vida. Ela é também avassaladora, como todas as outras forças da natureza. Sua energia descomunal pode produzir desastres assombrosos. Em grandes ajuntamentos, como nos mares, as águas são aterradoras: sua vastidão imensurável, seu volume espantoso, sua profundidade inacessível, sua força indomável, tudo isto faz-nos sentir dramaticamente insignificantes e frágeis.
São múltiplas e muitas as experiências humanas face a este elemento. Muitos e múltiplos são, por isso, também os significados da água no universo arquetípico e simbólico.Assemelhados aos sentimentos que os humanos experimentam em relação à água são os sentimentos que temos acerca de Deus.
Há, para onde quer que se volte o nosso olhar, algo que pervade todas as coisas, colocando-as no mundo e retirando-as daí, fecundando-as e recolhendo-as no seu abismo. Como as águas que jorram das camadas secretas da terra ou caem da vastidão do infinito, assim também o seu dar-se a nós: suas origens nos são ocultas. Quanto mais lhe prestamos atenção, mais fascina-nos o seu mistério e mais tremendo se nos parece o seu poder. Como as águas, que podem ser suaves e terríveis, humildes e portentosas, cristalinas e obscuras, preciosas e estarrecedoras, assim também a força misteriosa deste Inominável: fascinante e tremendo. É por isso que, desde sempre, os homens viram, nas águas, um símbolo de Deus.
As Escrituras Sagradas conservaram, nas suas páginas, esta ambivalência experiencial em dois complexos simbólicos. O dilúvio (Gn 6, 9-8,22) e o batismo (Mt 3, 13-17). No primeiro, a água inunda, destrói e se configura como uma força, frente à qual as criaturas pouco valem. No segundo, ela lava, purifica, redime, é visibilidade da graça e da bondade que, prodigamente, nos sustentam. Em ambos os casos, podemos, de fato, entrever as feições do Mistério que chamamos Deus: sua magnitude faz-nos baixar os olhos em humilde admiração e sua bondade faz-nos erguer a face em ridente gratidão. Inescrutável, como os abismos do mar, é o seu profundo. Sentimo-nos como seus filhos e filhas. Ele nos é verdadeiramente próximo e íntimo. Esta proximidade, porém, não anula sua infinita distância e o seu segredo. À sua frente, nada somos por nossa própria força e o que somos, devemo-lo a Ele. Suave, como a água que escorre sobre o dorso dos corpos e da terra, é a sua presença. Vigorosa e impressionante, como as tempestades que vergam as árvores e revolvem os mares, é a força de seu poder.
Na Palestina, há um grande lago. Os antigos deram-lhe vários nomes: Mar da Galiléia, Mar de Tiberíades, Lago de Genesaré, Yam-Gennesar (o Mar Jardim), pelo viço de suas planícies litorâneas, ou simplesmente: o Mar. Por causa da quase constante beleza, serenidade e transparência de suas águas, os árabes chamam-no até hoje de Ajn Allah’, que significa: o Olhar de Deus. Aqui, nas praias do Mar Jardim, surgindo quase que do nada, na verdade: vindo da outra margem de todos os mares deste mundo, sim, do jardim de Deus, apareceu, um dia, Jesus de Nazaré. Ali, nas cercanias daquele lago, ele teria convocado os seus discípulos, falado aos homens, feito muitos milagres e encantado as multidões. Essa parece ter sido a mais dileta paisagem de toda sua terra natal. Talvez, por um motivo muito simples: existem coisas, muitas até, neste mundo que nos arrebatam para Deus. Uma rocha, uma árvore, o céu, as estrelas, o fogo, o ar, a água, um lago, uma pessoa.
Nada disso é sagrado, mas, junto a essas coisas, sentimo-nos, não raro, reportados à firmeza (rocha), à proteção (árvore), ao infinito (céu), à luz (estrelas), ao calor (fogo), à suavidade (ar), ao alívio e à força (água), ao sustentáculo (lago) de nossa própria vida e de todas as coisas: Deus. Assim também para Jesus de Nazaré.
O Mar da Galiléia era-lhe, com certeza, um sacramento daquele que Ele, carinhosamente, chamava de seu Pai. E talvez seja por isso que Ele tenha permanecido durante toda a sua vida à beira de um lago: para que nós, ouvindo-O e vendo o Yam-Gennesar (o Mar Jardim), compreendêssemos que a mais alta vocação deste mundo é ser um jardim e não um deserto e para que, avistando à nossa frente Jesus Cristo, o amor humanitário de Deus (Tt 2, 11), e o Ajn Allah’, nos sentíssemos, para sempre, sob o Olhar de Deus. E contemplando, quem sabe, na superfície de todas as águas, como num espelho, o céu, mais ainda nos esforçássemos para que esta nossa terra fosse, verdadeiramente e para todos, não mais um vale-apenas-de-lágrimas, mas um reflexo dos céus.

autor: Frei Prudente Nery, OFMCap

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